domingo, 2 de maio de 2021

Crítica ao filme "Nomadland - Sobreviver na América", protagonizado por Frances McDormand e vencedor de 3 Óscares, incluindo o de Melhor Filme - uma história humana e real da vida dos nómadas

Nomadland – Sobreviver na América é um dos filmes mais falados no momento e já está disponível nos cinemas portugueses, sendo que foi recentemente o vencedor na edição 2021 da cerimónia dos Óscares nas categorias de Melhor Filme, Melhor Atriz (Frances McDormand) e Melhor Realização (Chloé Zhao), mas também venceu outros prémios consagrados, tais como quatro BAFTA (Melhor Filme, Melhor Realização, Melhor Atriz e Melhor Fotografia), dois Globos de Ouro para Melhor Filme de Drama e Melhor Realização, um Leão de Ouro de Melhor Filme, no Festival de Cinema de Veneza, entre outros.

Este drama de 2020 é baseado na obra de 2017, Nomadland: Surviving America in the Twenty-First Century, de Jessica Bruder, com argumento e realização de Chloé Zhao. O elenco é constituído por Frances McDormand (Fern), David Strathairn (Dave), Linda May (Linda), Charlene Swankie (Swankie) e Bob Wells (Bob).

A história apresenta Linda May, Swankie e Bob Wells, verdadeiros nómadas, como mentores e companheiros de Fern (Frances McDormand) durante a sua viagem pelas vastas paisagens do oeste americano. Após ter ocorrido o colapso económico de uma cidade empresarial situada na zona rural de Nevada, Fern resolve preparar a sua carrinha e partir pela estrada fora, explorando uma vida fora da sociedade convencional, como uma autêntica nómada moderna.

Divulgação: NOS AUDIOVISUAIS

São vários os efeitos que a crise económica pode ter na vida de qualquer um, mas no caso de Fern implicou uma mudança súbita na sua vida, sendo que esta é uma mulher viúva que perdeu tudo e que acabou por comprar uma carrinha e assim, viajar pelas estradas e vastas paisagens do oeste americano, ao mesmo tempo que foi arranjando trabalhos temporários para que conseguisse sobreviver sozinha.

Fern é uma mulher de 60 anos que fez uma escolha de vida corajosa e ousada que foi começar uma vida nova e sozinha como uma nómada e seguir um futuro incerto, pois já não tinha mais nada a perder. Ela acaba por estar à procura de um tipo de significado para seguir com a sua vida depois de ter perdido o seu emprego numa fábrica que fechou em Empire e o seu marido, mas pelo caminho vai tendo trabalhos temporários, alguns deles sazonais. Será que ela vai encontrar as respostas que procura?

Após abandonar a cidade de Empire, Fern está constantemente a movimentar-se na sua carrinha que foi remodelada para funcionar como um lar bem simples e prático que contém as memórias da sua vida passada. Assim, ela é daquelas pessoas que nunca fica muito tempo no mesmo sítio, já que ela visita diferentes acampamentos ao longo do deserto ou fica em estacionamentos por pouco tempo e por isso, nós vamos acompanhando o seu dia a dia na sua vida como nómada.

Divulgação: NOS AUDIOVISUAIS

Ao longo da sua jornada, Fern vai fazendo descobertas e tendo uma transformação eficaz numa nómada dos tempos modernos que tem um determinado significado e acaba por ser uma autêntica aventura para ela, sendo que vai conhecendo pessoas desta comunidade que lhe dão lições bem úteis para viver neste estilo de vida bem específico. Estas são pessoas com quem ela se cruza que lhe deram conselhos e dicas de como sobreviver ou lições sobre a vida num geral e que não podem estar presentes a toda a hora, mas que sem dúvida, deixaram uma marca na vida de Fern como companheiros, amigos, mentores e confidentes.

Divulgação: NOS AUDIOVISUAIS

Fern é uma personagem complexa, forte e impaciente, mas também humilde e simpática que sabe ter uma conversa séria quando é necessário e também sabe tratar todos muito bem e com respeito. Após o fecho da fábrica onde trabalhava, ela acaba por ficar maioritariamente dependente de um trabalho que vai tendo na Amazon em períodos específicos do ano. Ela é uma mulher que vive uma vida solitária e repleta de sofrimento devido a várias perdas que foram surgindo na sua vida, mas lida de um modo muito próprio, sendo que dá para ver que existe uma solidão e uma tristeza no olhar de Fern.

Esta é uma mulher muito prática que tem uma nova rotina e se define por não ser uma pessoa sem um lar, mas sim alguém que só não tem uma casa. Uma vida sem grandes confortos é o suficiente para ela estar bem. Quando uma expressão facial transmite aquilo que precisamos de saber sobre o modo como alguém se está a sentir sem serem necessárias palavras e isso é algo que acontece frequentemente com Fern.

Frances McDormand está de parabéns por um desempenho notável em que consegue mostrar ligeiramente e com eficácia, as vulnerabilidades da sua personagem e por isso, ela mereceu o Óscar de Melhor Atriz pela sua interpretação de Fern.

Infelizmente é frequente quando um negócio falha ou neste caso, uma fábrica que teve de fechar as suas portas, devido a uma crise económica, fazendo com que muitas pessoas perdessem a sua fonte de sustento e levando a escolhas de vida inevitáveis. Por isso, as pessoas são afetadas com mudanças repentinas e por vezes, radicais nas suas vidas depois de sofrerem grandes perdas.

Divulgação: NOS AUDIOVISUAIS

Num mundo que não dá valor a todos, uma vida de um nómada nem sempre se inicia por opção, mas sim por pura necessidade e muitas vezes devido a razões económicas que é uma realidade para muitos americanos. A vida na estrada não é fácil, pois estas pessoas passam por situações de perigo, frio e pobreza e sem dúvida, que é uma longa jornada que têm de percorrer, passando por experiências e enfrentando escolhas que vão ocorrendo ao longo da sua viagem.

Temos a oportunidade de acompanhar uma jornada que inclui a história e a vivência de verdadeiros nómadas que são pessoas que não têm casa e vão viajando pelo país nas suas carrinhas ou caravanas que têm as suas próprias rotinas, culturas, costumes e tradições que escolheram este caminho por vontade própria ou devido às circunstâncias que ocorreram nas suas vidas. É uma jornada constituída por altos e baixos que mostra uma realidade crua em que algumas pessoas vivem, dilemas que vão tendo pelo caminho, situações pelas quais têm de passar para conseguirem sobreviver com o mínimo de necessidades e o que fazem quando há falta de recursos.

Divulgação: NOS AUDIOVISUAIS

Este filme aborda vários temas que são relevantes para a sociedade como é o caso do capitalismo e as consequências devastadoras que pode vir a ter para a população, uns mais do que outros. Seja o modo como se convive com a solidão e se lida com o luto, noções sobre o que significa viver de verdade, a desigualdade, as injustiças e os diferentes tipos de expetativas que podem existir não só para os nómadas, mas também para os seus familiares que nem sempre compreendem totalmente este modo de vida.

Esta é uma história bem real sobre pessoas e as suas respetivas vidas que têm valor e ajudam a refletir não só sobre a nossa existência como seres humanos, mas também pela forma como decidimos viver a nossa vida, onde damos importância a coisas que nem sequer valem a pena em vez de valorizarmos aquilo que mais importa. Ao longo deste caminho vai mostrando as dificuldades e adversidades que qualquer um de nós pode vir a passar ao longo da nossa vida.

Este é um bom drama que é intenso e onde entrega mensagens importantes que podem fazer toda a diferença no modo como interpretamos a vida e as expetativas que vamos tendo ao longo do caminho, pois a pessoa acaba por processar tudo aquilo que está a ver, principalmente nos seus momentos mais silenciosos e deixa-nos com uma mistura de sensações e pensamentos que vamos questionando e acabamos por inserir num momento de pura reflexão e valorizando aquilo que é mais importante.

Divulgação: NOS AUDIOVISUAIS

Basta uma mensagem tão simples como “nos vemos na estrada que dá uma sensação de esperança e ao mesmo tempo de afinidade de que se vai voltar a ver essa pessoa num futuro reencontro, porque a comunidade dos nómadas que tem uma ligação especial com a Natureza e passam bons momentos juntos não só se apoiam uns aos outros, mas também mostram a realidade dura em que vivem, a sua resiliência, luta diária, adaptação e criatividade num modo de vida bem diferente do que qualquer um possa estar habituado e o desejo de viverem uma vida tranquila por mais obstáculos que possam vir a surgir em que podem fazer muito com tão pouco disponível e onde a solidão não importa.

Nomadland tem um tema interessante que apresenta com uma sensibilidade e com uma qualidade técnica maravilhosa, principalmente a nível de cinematografia e montagem, sendo constituído por um ritmo bem lento, mas de certa forma leve e bem simples, mesmo que aborde temas significativos para a sociedade que deixa qualquer um a pensar e por uma fotografia muito bem adequada à história que estão a contar. A realização é cuidadosa e organizada de um modo inteligente, em que tenta mostrar o ponto de vista de cada uma destas pessoas de uma forma próxima, sem complicar e fazendo de um modo bem natural e fluído, mas acima de tudo, respeitoso em que os enquadramentos apresentam exatamente aquilo que precisamos ver.

Divulgação: NOS AUDIOVISUAIS

O que não faltam são planos abertos que mostram paisagens bonitas e naturais que podem ser desertos americanos, em que ao mesmo tempo são locais pelo qual a pessoa está num isolamento completo e a viver muitas vezes no meio do nada, mas dá para perceber que acabam por estar em contacto com a Natureza e com uma grande sensação de liberdade.

Esta é uma história sensível, humana, bem delineada e com uma boa credibilidade que não cria exageros, mas que representa a vida de uma comunidade diferente que é feita com a participação de pessoas reais que são experientes na vida nómada e estão a contar a sua história sobre o seu estilo de vida que vai tendo condições bem peculiares, mostrando as dificuldades pelas quais vão passando, pois não é uma vida fácil de se viver e apresenta a simplicidade da vida de um nómada, o seu lado mais bonito e outras vezes bem duro, mas acima de tudo, livre.

Divulgação: NOS AUDIOVISUAIS

Nomadland é um drama com diálogos interessantes que cria uma discussão e apresenta a essência do que é viver como um nómada que vai sendo mostrado em diversos ângulos. Este consegue criar o seu impacto para com o público que consegue identificar-se com a história que está a ser contada, prendendo assim, a sua atenção e onde também explora as relações humanas. E temos a oportunidade de olhar para a vida através da perspetiva dos nómadas, dando valor às pequenas coisas da vida, criando assim, uma certa curiosidade e interesse em saber mais sobre este tipo de vida e tudo o que é implicado.

Este é um filme de reflexão que consegue misturar bem o real com a ficção, cumpriu com o seu propósito e toca a pessoa com a sua história delicada que é contada com facilidade e é realizada com todo o cuidado e elegância, mas que se torna numa experiência simples, mas enriquecedora para o espetado por tudo aquilo que vai aprendendo, entre elas, lições vitais sobre a vida. Pode não ser muito bem compreendido por todos e assim podem gostar, como podem não gostar, mas é uma obra cinematográfica que vale a pena ver e ter assim, uma noção sobre um tema que não é muito falado e assim, aprendermos mais sobre esta comunidade e todas as vantagens e desvantagens sobre as suas escolhas de vida ou circunstâncias que fizeram com que tivessem de tomar decisões difíceis. 


Sem comentários:

Enviar um comentário